sábado, 14 de novembro de 2009

EQUIPA DE ARBITRAGEM FEMININA

Do insulto machista, como os típicos ´vão lavar a louça´ ou ´o lugar das mulheres é na cozinha´, ao piropo ´que pernocas tão jeitosas´, Ana Sofia Aguiar, Patrícia Azevedo, Luciana Oliveira e Sílvia Silva, quatro jovens que compõem uma das duas equipas de arbitragem da Associação de Futebol do Porto constituídas só por mulheres, já foram brindadas com um pouco de tudo pelos adeptos do futebol distrital. Para elas, todas as provocações não passam de música para os ouvidos, pois estão concentradas noutras coisas. ´Nem ouvimos o que dizem da bancada. Mas tudo o que envolva a lida da casa é o insulto básico´, explica a porta-voz do grupo, Ana Sofia, que lidera a equipa. Alturas houve em que não conseguiram evitar o sorriso a algumas ´bocas´. ´Tive uma por causa da altura. Quando fazia equipa com outras colegas, uma delas era muito alta e eu e a outra assistente bem mais baixas e então ouvimos ´olha, parecem um galheteiro´´, contou a árbitra.

Cientes de que estão inseridas num mundo ainda visto como ´só para homens´, o que é certo é que se sentem bem no papel que desempenham, seja a apitar um jogo do distrital, das camadas jovens ou de feminino. ´É um desafio. Claro que há momentos em que é um pouco menos agradável, em que nos deparamos com algumas barreiras. Somos poucas, mas estamos presentes e a tentar que o sector feminino na arbitragem aumente, tenha mais qualidade e evolua´.

A reacção a esta incursão feminina neste desporto tem sido positiva. Clubes e jogadores parecem aceitar as ´ordens´ dadas por esta equipa. ´Há muitos clubes que nos conhecem e reagem bem, mas há outros que ainda ficam surpresos ao ver mulheres a apitar. Já aconteceu chegarmos ao local destinado à viatura da equipa de arbitragem e dizerem que não podemos estacionar ali. Quando nos identificamos, ficam a olhar à espera de ver pelo menos um homem, para aguentar a pressão do jogo´, contam.

Da parte dos atletas, notam que há maior contenção verbal e física. ´Às vezes, é mais complicado apitar os jogos de equipas femininas, pois não há tanto respeito. Vêem-se de igual para igual. Com os homens, cria-se uma relação mais distante e, ao mesmo tempo, mais calma, pois bater em mulheres seria, para eles, uma cobardia´, explicou.

Embora só estejam juntas desde o início da época, o que é certo é que as críticas têm sido mínimas e os elogios muitos. ´Mostro aos jogadores que gosto de deixar jogar, mas estou atenta ao que fazem. O propósito é o espectáculo, que o jogo decorra com normalidade e todos os jogadores possam participar´. Os elogios, agradecem, mas o objectivo é outro. ´No final, queremos sentir que demos o nosso melhor e que todos os intervenientes gostaram do trabalho´, referem. Para isso, é fundamental o trabalho de equipa e a boa condição física. ´Se estiver bem fisicamente, estarei em melhor condição para analisar os lances e a probabilidade de ser enganada será menor. Mesmo em termos de leis, preocupamo-nos em estar actualizadas com as alterações, para as aplicarmos bem nos jogos´, complementou Ana Sofia Aguiar.

Ana Sofia Aguiar também tem algumas histórias. ´Tive um episódio com um guarda-redes, a quem mostrei vermelho directo, em que, por momentos, pensei que me pudesse agredir, mas foi agarrado pelos colegas. No futebol feminino, na época passada, uma jogadora não chegou a vias de facto porque as outras a seguraram. E, há dias, uma treinadora, que expulsei, fez questão de se encostar a mim, mas as atletas puxaram-na para trás. Não são agressões, mas são instintos agressivos, sem dúvida´.

Estes episódios são geridos com muita calma. ´Sente-se um friozinho na barriga, os joelhos tremem, mas nunca recuo´, afirmou Ana Sofia Aguiar, concluindo ´Posso levar um estalo, murro ou pontapé, mas quem vai ser prejudicado é quem me bateu, pois no relatório do jogo vou escrever o que aconteceu´.

Fonte: Jornal de Notícias

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